sábado, 8 de outubro de 2011

Cinema Secreto: Cinegnose: Em "Contraponto" a "Alice" de Lewis Carroll se encontra com "Psicose" de Hitchcock

Cinema Secreto: Cinegnose: Em "Contraponto" a "Alice" de Lewis Carroll se encontra com "Psicose" de Hitchcock

Porque parou, parou porque...

Três ruas do Batel foram agraciadas com emendas do Deputado Angelo Vanhoni, do PT PR. A pavimentação por blocos começou no primeiro semestre de 2011, depois das enchentes e de toda aquela desgraceira que conhecemos. Então, sem menos nem mais, as obras pararam. Eu, que sou cidadã, moradora do bairro, sócia da AMBB  (que foi quem reivindicou ao Sr. Prefeito as ditas melhorias), pergunto: Porque parou? tem orçamento aprovado e depositado na CEF, segundo informou o Canduca. Trabalhadores da obra dizem que está parada porque não tem dinheiro para pagar a empreiteira. Como sabemos que o que falta na nossa prefeitura é uma comunicação eficiente com a população, gostaria que o Sr. Prefeito respondesse de viva voz, sem a intermediação do padre ou de outro comunicador qualquer da cidade. O POVO SOFRIDO DO BATEL QUER SABER.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Sonho de menina

Sonia Nascimento

Larissa lembra, já faz uns dois anos que sonha com a boneca. Viu-a pela primeira vez na casa da patroa da mãe. Na época em que se comemora Natal ela aparece como a estrela dos anúncios de televisão. É tão linda, fofinha, com cara de bebê de verdade, e vem com um monte de roupinhas pra trocar. Sabe que a mãe nunca vai arranjar dinheiro suficiente pra comprar esse presente, mas não desiste. Vai para a escola no turno da manhã, e as meninas falam da boneca, é o sonho delas. Todas são como ela, moram na mesma vila, mas algumas parecem ter privilégios. A mãe fala sem papas na língua de onde vem os recursos dos pais dessas amiguinhas, e ela já tem idade suficiente para entender o que é tráfico de drogas. Está proibida de visitar a casa dessas meninas, principalmente uma delas, que mora justo em frente à sua. Mas a mãe não tem tantos olhos nem tanto tempo para vigiá-la. Trabalha em período integral na casa de uma professora, num bairro distante. De vez em quando a patroa permite levá-la, e ela passa a tarde na cozinha, entediada, enquanto a mãe arruma todo o apartamento, varre, espana, limpa vidro. Só gosta de ir porque pode comer coisas diferentes, a patroa deixa sempre um sorvete, um iogurte, bolo, sobremesas, tudo guardado para ela na geladeira. Não tem crianças na casa, mas a filha do zelador a chama sempre pra brincar e ficam as duas trancadas no quarto, cheias de brinquedos que Deocelly ganha dos moradores do prédio. Mas nem mesmo ela tem aquela boneca sonhada.

A patroa não tem crianças, mas gosta de comprar brinquedos para os sobrinhos. Foi perto do Natal que ela viu a boneca sendo embalada para uma longa viagem, ia ser entregue pelo correio para uma menina que ela não conhecia, no sul do país. Dona Iara a deixou segurar um pouquinho e ela quase desfaleceu ao sentir o corpinho do bebê junto ao seu, a cara rosada cheirando a morango. Desde esse dia sonha com um presente igual, mas sabe que a mãe nunca vai poder lhe dar.

A mãe não a engana quanto a essa possibilidade. Pelo contrário, ela é muito dura quando lhe mostra a realidade da situação das duas. Não conheceu o pai e os parentes da mãe moram no norte, muito longe. Falam-se por telefone quando ela consegue ter créditos no celular, o que é muito raro. Chegam longas cartas, em letra muito atrapalhada que ela não consegue decifrar. Tem fotos dos avós e tios, gente pobre como as que os documentários da TV mostram de vez em quando.

Fica sozinha quase todas as tardes, exceto quando vai com a mãe para o trabalho dela. Burla a vigilância e vai brincar com Mariana. a menina da casa em frente. A casa de Mariana é melhor, com um quarto só para ela na parte de cima. A casa foi reformada com dinheiro da venda de drogas, de acordo com as conversas dos vizinhos. Não é grande coisa se comparada com as casas do bairro da patroa da mãe, mas é a melhor da vila. Tem até varanda e um quintal caprichado, com churrasqueira e lugar pra brincar. E as brincadeiras na casa da Mariana são mais divertidas quando o pai dela está em casa. Ele gosta de crianças, sempre tem balas e chocolates, deixa que as duas entrem na casa, que brinquem no quarto dela. Mariana tem um Bebezinho, mas não a deixa tocá-la quase nunca. Desde que notou o quanto Larissa a deseja, regateia e esconde, valorizando o brinquedo ainda mais, trocando o simples ato de mostrá-la na caixa por posições nas brincadeiras (eu é que sou a mãe, eu é que sou a professora, eu é que era a princesa, eu que ganhei mais pontos). Ela cede fácil quando em troca pode tocar a boneca, cheirá-la, amassar com as mãos as sua roupinhas.

O pai de Mariana diz que vai lhe dar um Bebezinho. Assim tem repetido quando brincam de papai e mamãe, uma brincadeira que começou com esconde-esconde e tem evoluído para coisas que ela sabe que não são muito certas. A mãe sempre lhe diz que não deve deixar nenhum homem tocar seu corpo. Logo será uma mocinha e vai poder namorar, mas agora deve preservar-se. Nunca vai contar à mãe. Tudo que o pai de Mariana faz é feio para os padrões dela, mas Larissa deixa, porque só assim vai poder ganhar sua boneca. Na semana passada ele pediu que ela tirasse a roupa. Ela ficou com medo. Doeu e saiu sangue, e teve que prometer não contar a ninguém. Agora ele tem repetido a brincadeira, que evoluiu para outras coisas. Não sabe como fazer para que a mãe não perceba. Tem que chegar cedo em casa, antes dela, e trocar-se, lavar, não demonstrar que está machucada.

Por isso está se preparando tanto hoje. A mãe já foi, Mas não vai à casa de Mariana. O pai dela é quem vem brincar, isso é um segredo dos dois. Disse que vai lhe dar banho, perfumar, enxugar. Em troca, amanhã vai ser o grande dia. Nem acredita que seu sonho vai virar realidade. Ele vai trazer a boneca e então vai poder ficar longe dele, nunca mais vai machucá-la. E ela nunca mais vai precisar sair de casa, porque vai ter a sua própria filhinha, seu bebezinho, sua bonequinha.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

RESENHA “TREM NOTURNO PARA LISBOA” Autor: Pascal Mercier Classe: Romance


   O professor Raimund Gregorius leciona línguas clássicas numa escola em Berna, Suíça. Depois de um encontro inusitado com uma mulher portuguesa, abandona a escola e sua vida regrada para descobrir, em Portugal, Lisboa, como viveu e morreu o autor de um livro que encontra num antiquário. Nesse percurso, conhece pessoas e fatos que mudam totalmente a sua vida e a forma como compreende seu passado.
    O livro foi construído em quatro partes. Na primeira, o autor trata da partida do personagem para Portugal. Na segunda, narra o encontro com a vida de Amadeu de Prado, o escritor. Na terceira, a tentativa de compreender as razões e emoções de Prado. Por fim, na quarta, o seu retorno à Berna e a constatação de quanto havia mudado.
    Durante toda a leitura, o leitor é levado a conhecer Lisboa sob a ótica dos personagens, em duas épocas distintas: a de hoje e a da ditadura de Salazar, formando aos poucos o quebra-cabeças que é a personalidade surpreendente de Amadeu. Trata-se e um médico que dedicou sua vida aos pobres, até que um dia salva a vida de um temido oficial da polícia salazarista. Daí em diante é desprezado pelos pacientes. Para se redimir perante os olhos da população passa a trabalhar para a resistência.
    Da obra destacam-se os textos escritos por Amadeu, que são páginas filosóficas sobre a vida, a religião e o ateísmo do personagem, sua luta entre a fé a razão. É sobre as relações humanas e as múltiplas faces de cada um. Os trechos do livro de Amadeu se entrelaçam com a vida de Gregorius de uma forma sutil e, ao longo do livro, o professor passa a ser alguém que surpreende a si mesmo a cada momento, um desconhecido que transforma o sentido de sua vida e a capacidade de sentir e se relacionar com o outro.
    O livro é, como disse Izabel Allende, um deleite para a alma. É ideal para quem procura uma leitura filosófica ou busca argumentos para um sentido da vida. É, todo o tempo, comovente, mas nunca piegas ou apelativo.
   O autor, Pascal Mercier, é na verdade Peter Bieri. Nasceu em 1944 em Berna. Vive em Berlim, onde leciona filosofia. Publicou três romances e um ensaio. Este romance já foi traduzido para 15 idiomas e ficou três anos na lista dos mais vendidos.